sexta-feira, 24 de julho de 2015

Menina pássaro

Ele parecia o cara ideal, o príncipe encantado que eu passei a vida inteira ouvindo de filmes, novelas, e das minhas amigas que eu deveria encontrar. Eu sempre gostei da minha própria companhia e não conseguia entender por que isso parecia tão errado para as outras pessoas, mas eu passei a ouvir com tanta frequência que eu precisava ter um homem do meu lado, que eu mesma passei a acreditar. Foi aí que eu o conheci...
Ele parecia um anjo, fazia coisas que me fizeram acreditar que ter ele do lado era privilégio. Me buscava em casa, me deixava em casa, minha família adorava ele, bebia junto. Acabamos nos tornando o famoso "dois em um". Eu tinha perdido alguma coisa da minha identidade que naquele momento parecia que valia a pena ter perdido isso pra estar com ele. E isso só foi crescendo...
Eu queria fazer as dancinhas divertidas que eu costumava fazer me sentindo livre, e o convidava pra fazer também. Ele dizia que não e que eu deveria parar também, por algum motivo mal explicado. Então, comecei a de fato, perder o gosto por dançar. Eu queria usar um shortinho e ouvi tantas vezes ele dizer que os caras na ruas e os próprios amigos dele ficariam olhando, que comecei a acreditar que a culpa era minha, o problema era eu. Então, passei a repudiar esse tipo de roupa, por mais a vontade que me deixasse. E o pior comecei a repudiar pessoas que usavam aquilo também. Eu me afastei de todos os meus amigos do sexo masculino, por que ele dizia que alguns afagos e carinhos eram por que eles eram afim de mim. Pra tudo ele começou a achar um motivo pra eu me desfazer e não sei se por gostar demais dele, parecia realmente coerente no momento. Até que eu me vi ali, só eu e ele. Sem minhas dancinhas bobas, sem as mesmas roupas de antes, sem os mesmos pensamentos de antes, sem amigos, ou melhor/pior: apenas com os amigos dele.
Lembro como se fosse hoje do dia em que uma outra moça flertou ele na minha frente e foi comigo que ele brigou, por não ter respondido nada pra ela. E de fato, eu não respondi, por que achava que esse era o papel dele. Achava que em um relacionamento cada um tem que ter o espaço pra se posicionar. Mas na cabeça dele as coisas não funcionavam dessa forma. Enfim...
Sempre tem os dias de briga, mas ali as coisas começaram a ficar absurdamente tensas, não havia mais um dia que não houvesse divergências ente nós dois. Até que um dia ele terminou, por que "eu havia mudado muito", eu aceitei o término, por uma questão de cansaço mental, eu já não aguentava mais brigar, apesar de achar que eu estava o perdendo. Eu saí da casa com essa frase ecoando na minha mente: "Eu havia mudado muito Eu havia mudado muito Eu havia mudado muito". ELE TINHA TODA RAZÃO! O que restou da menina que queria viajar o mundo, fazer dancinhas bobas em festas livremente, que abraçava, ria e adorava estar com os amigos?
Em todo término a gente sente que perdeu algo e chora de soluçar como se a dor nunca fosse passar. Comigo não foi diferente: Eu passei um dia inteiro chorando. E um filme de tudo que eu mudei, do quanto estava me sentindo prisioneira, retraída passou na minha cabeça,
Mas no dia seguinte, eu comecei a sentir uma liberdade que já era desconhecida, pra mim. Me levaram a um lugar lindo, que tocava essa música: https://www.youtube.com/watch?v=pYyBmQf80XM&feature=youtu.be e eu comecei a rodopiar sozinha, dançar, fazer todas as dancinhas bobas que eu podia, sem olhar ao redor pra ver a cara das pessoas, sem me importar com o que elas pensavam. E foi quando olhei meus braços e no lugar deles, haviam algumas penas. Então, no outro dia eu comecei a ir nos lugares que antes eram os meus preferidos de ir sozinha e curtir minha companhia, com a roupa que eu queria estar. E mais uma vez ao olhar meus braços, haviam mais penas do que no dia anterior. E não parei mais... voltei a assistir meus filmes preferidos, tomar meu sorvete preferido, me presentear, ir ao cinema, visitar amigos, curtir minha própria companhia. E cada vez mais os braços já não eram mais braços. Eram agora um belo par de asas. Então um dia encontrei com uma conhecida e o namorado dela, e depois de alguns minutos de conversa, ela disse meio rindo, aquelas coisas que já não eram estranhas: " Tu tá aqui sozinha? Tá precisando de um namorado urgente". Então eu utilizei meu belo par de asas, e voei alto, voei, voei, pra bem longe deles. Não sei exatamente, mas acho que depois que você se torna pássaro, ser prisioneira das convenções já não interessa mais. E eu? Ah, eu amava saber voar...

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